domingo, 31 de dezembro de 2017

CINEMA | 2017

2017 foi um ano excelente para o cinema. E entre muitas aventuras, acabei indo
no cinema várias vezes e vi muita coisa ruim, muita coisa boa, muita coisa
eternizada.
Aqui vai a minha lista e analise do que o cinema ofereceu de bom e de ruim neste
ano tenebroso.
NÃO VI AINDA, TALVEZ MUDARIAM A LISTA:
THE SHAPE OF WATER | THE PHANTOM THREAD | THE DISASTER ARTIST |
LADY BIRD | OKJA | HUMAN FLOW | VISAGES, VILLAGES


MENÇÕES HONROSAS
SPLIT
SPIDERMAN HOMECOMING
ALIEN COVENANT
MURDER IN THE ORIENT EXPRESS
YOUR NAME
LOVING VINCENT


DECEPÇÕES DO ANO
4 - LIGA DA JUSTIÇA (Justice League - Zack Snyder / Joss Whedon)
Depois de entregar todos os ovos da cesta para um diretor que não entende os
personagens, a Warner tentou remendar. Segura a goteira? Segura. Mas o que
merecia ser o primeiro de uma saga de grandes filmes de alguns dos personagens
mais queridos de todas as mídias se torna um filme pizza, esquecível. A loucura
tonal, o roteiro chinfrim e a insana tentativa de cobrir o bigode do Superman
conseguiram afundar ainda mais o filme. É divertidinho, mas é decepcionante.


3 - A BELA E A FERA (Beauty and the Beast - Bill Condon)
Não é um filme ruim, de maneira nenhuma. A arte e o trabalho de fotografia são
muito bons, a Emma Watson está muito boa e o Luke Evans se diverte em cena.
Participações especiais lindas aos montes. Mas algo ali não clicava. A mágica do
desenho animado original não foi encontrada em lugar algum. É um filme meio
engessado, que dá a impressão de não andar pra frente.

2 - VALERIAN AND THE CITY OF A THOUSAND PLANETS
O Quinto Elemento é um tremendo pipocão que, se você cutucar com um alfinete,
explode e te deixa lambuzado com carisma. A inventividade frenética de Luc
Besson funciona de maneira sublime, mas porque é ancorada por um elenco
sensacional e uma pureza nas atuações, especialmente na de Mila Jovovich.
Valerian não é. Valerian tenta ser, mas não chega perto. E não é a infinita paixão
de Luc Besson por conceitos insanos em cima de conceitos insanos, nem a
direção firme em cenas de ação empolgantes. A cena da perseguição nos
universos paralelos do começo do filme é inesquecível. O problema é que o par
de protagonistas estão, durante o filme todo, com preguiça de convencer o público
que eles merecem nosso apoio. É o relacionamento romântico menos funcional
do ano. Qualquer tentativa de funcionar derruba tudo o que o filme estava
empenhado em construir.

1 - THE DARK TOWER


Esse foi o ano do Stephen King, mas a maior e mais ambiciosa de suas obras foi
pro cinema para afundar. A Torre Negra é uma saga complicada, épica, atribulada,
tocante e cheia de conceitos de fantasia e de sci-fi que não só precisam de tempo
para serem explicados, precisam de poética, de sabedoria, de jogo de cintura.
The Dark Tower é só um filme de sci-fi/fantasia que pega 2% dos livros e
transforma numa perseguição pelo McGuffin. O esforço homérico de Idris Elba e
a canastra de Matthew Mcconaughey não sustentam o fato do filme ser, em
uma palavra, chato.
OS MELHORES FILMES DE 2017
15 - THE BEGUILED
“Bring me the anatomy book”.
Sofia Coppola dirige um thriller sexual que está nas sutilezas e nos detalhes. E
mesmo assim, ele não alivia nada na hora de criar traumas. Um filme sobre o
papel da mulher (se é que há um), a feminilidade, e uma dinâmica interessante
sobre paixão nos tempos de guerra. Nicole Kidman está melhor que nunca.

14 - LEGO BATMAN
“Life doesn’t give you seat belts.”
O Batman é uma instituição, muito mais do que um personagem. São tantas as
histórias, os pontos de vista, as interpretações da filosofia, que é fácil perder a
noção do que o Batman representa. Não só isso, mas a necessidade extrema por
seriedade impede as vezes a identificação entre nós e o homem-morcego. Isso e
o fato de que ele é um bilionário psicopata.
Mas Lego Batman faz outra coisa. Ele olha para o Batman como nenhum fã tentou
olhar, e o que vê é uma criança mimada, insegura e egocêntrica. E também vê
uma comédia frenética. O filme é ao mesmo tempo sátira, carta de amor, crítica
aos fãs e festa de cultura pop, e faz você perceber que não levar a sério um
homem sisudo que se fantasia de morcego as vezes faz bem. Só do filme tirar
um sarro especial das décadas de histórias do Batman, tanto das bizarras
passagens pela TV (o Egghead!) quando as novidades (o sotaque do Bane!),
já tem que tirar o capuz pra esse filme.

13 - THOR RAGNAROK
“I won. Easily.”
Um filme da Marvel, aos 40 do segundo tempo, que consegue ser hilário, belíssimo,
empolgante e ainda tem uma pequena discussão sobre colonialismo que, mesmo
sendo bem superficial, é inteligente demais para estar num filme de completo
besteirol espacial.
Taika Waititi ainda não chegou lá, mas deu um passo forte em direção à
genialidade. Thor Ragnarok, além de brincar, entende seus personagens, que
diferente dos outros filmes do Thor realmente significam alguma coisa agora.
E o Jeff Goldblum é a melhor coisa de um filme cheio de coisas ótimas.

12 - WONDER WOMAN
“I can save today. You can save the world.”
Mulher-Maravilha é um oasis. No meio de tanta mesmice e tanta ruindade no
mundo dos filmes dos super-heróis, eis um filme que só pelo detalhe de ser
dirigido por uma mulher, já faz toda a diferença. Pela primeira vez em décadas
vemos uma protagonista blockbuster ser retratada de maneira respeitosa, sem
um apelo sexual que seria completamente fora de contexto e gratuíto num filme
sobre os horrores da guerra.
Patty Jenkins dirige o filme com mãos firmes, e mesmo que o roteiro escorregue
(e olha que escorrega mesmo no final), a peteca não cai. Gal Gadot e Chris Pine
dominam cada fotograma com tanto carisma que não dá pra não se apaixonar
pelos dois. E ao invés de usar o feminismo como arma, Diana usa-o como escudo,
e te convida a segurar esse escudo em nome de um mundo melhor.

11 - GET OUT
“Where are the car keys?”
A nossa história toda, até agora, foi construída em cima dos corpos de gente
oprimida. Muito, muito diferente do Brasil, grande parte dos EUA já descobriram
a algum tempo a necessidade de exorcizar o racismo e a herança maldita da
escravidão.
Get Out metaforiza a opressão histórica dos negros pelos brancos num conto de
terror sufocante que não dá a menor chance de respiro. Daniel Kaluuya e seus
olhos dizem tanto, tanto, e as vezes o fazem com pouco.
Além disso, é um filme bem montado e dirigido com eficiência. Filme de estréia
do comediante Jordan Peele na direção, e talvez a estréia mais promissora
do ano.

10 - ICARUS
“Even to understand the word ‘doublethinkg’ involves the use of doublethink.”
Icarus é uma jornada tão louca que quando acaba, você lembra do começo e se
pergunta “como raios eu cheguei aqui?”.
O que era para ser um documentário expondo práticas de doping da maneira mais
pessoal e prática possível se transforma numa história real de espionagem, política
perigosa, máfia russa, esportes, superação pessoal, ética e uma forma um pouco
estranha de patriotismo. Inacreditável do começo ao fim.
9 - LOGAN
“This is how it feels.”
O único filme dos X-Men a acertar na mosca em todas as instâncias. Logan é um
faroeste, uma distopia, uma história de redenção e amor. Um homem cansado,
ferido e impotente coloca tudo a perder para não perder o que restou da sua alma,
e no caminho descobre o que é uma família.
Não só um filme forte e duro, mas uma despedida merecida aos papeis de Hugh
Jackman como Wolverine e Patrick Stewart, simplesmente mágico, como
Professor Xavier. Sem falar que finalmente um filme onde soltam o Wolverine,
exatamente como nos quadrinhos.

8 - MOTHER!
“I held his hand as he died.”
Mãe é um filme que fala coisas que nós já ouvimos. Exaustivamente. E não é nem
a versão mais madura dessas coisas. Mas, mesmo que seja um pouco insistente
demais, é o “como” ele diz essas coisas que interessa.
Um filme que tem uma mensagem tão complicada que consegue ser surrealista,
completamente análogo (a única maneira impossível de ler esse filme é
literalmente) e ainda assim perfeitamente acessível é um feito e tanto. Vindo do
cara que fez Noé e Cisne Negro então.
E é um filme muito bem feito A câmera-paranóia de Darren Aronofsky não nos
deixa fugir, nem dos momentos mais terríveis. Javier Bardem e Jennifer
Lawrence interpretam personagens difíceis, e todos saem no lucro.

7 - THREE BILLBOARDS OUTSIDE EBBING, MISSOURI
“What's the law on what ya can and can't say on a billboard?”
Um filme de microcosmo, onde uma minúscula cidade se transforma no universo
que importa. Frances McDormand, brilhando ainda mais do que já brilhou, faz
uma mulher que não tem medo de enfurecer uma cidade inteira por causa do
assassinato da filha.
Ao invés de buscar respostas simples, ou mesmo qualquer resposta, o filme vai
buscar a alma de todo tipo de pessoa, do cara legal sofrendo pressões até o mais
odioso dos preconceituosos, e tenta encontrar a humanidade que sobrou em todos
eles. E a surpresa é que o filme acha essa humanidade, pontuada por atuações
incríveis e todos os lados. Sam Rockwell prova que é um gênio aqui, se isso não
estava claro antes. Baita filme surpreendente, com uma cena em plano-sequência
que é uma horrorosa catarse.

6 - IT
“Fear.”
Um filme de horror que não vai atrás das fórmulas. Que vai atrás de criar
personagens de verdade, faz a relação entre eles funcionarem e só então solta o
bicho do mal em cima deles.
O Pennywise desse It de 2017 é ótimo, mas não é a melhor coisa do filme. São as
crianças, que estão atuando maravilhosamente bem e fazem você sentir todo o
peso de estarem numa cidade amaldiçoada por sua humanidade crua e vil. O
vilão pode ser o palhaço, mas o monstro é a população de uma cidade que abusa
dos seus.
Sem falar de que só pelo susto do banheiro, o filme já merece aplausos.
Executado perfeitamente, sem clichê nem previsão nenhuma.

5 - BLADE RUNNER 2049
“Oh, i see, you don’t like real girls”.
Dennis Villeneuve fez o melhor filme do ano passado, e segue forte com uma
das ideias mais arriscadas da carreira. Continuação é um negócio esquisito,
ainda mais de filme clássico amado e idolatrado.
E embora o roteiro escorregue em uma ou outra definição, e o filme seja longo
(O Harrison Ford só aparece em cena depois de duas horas), Blade Runner 2049
é um triunfo. E é porque faz tantas escolhas corretas. Contar uma história original,
com um personagem original, com conflitos novos e bem instigantes. É um alívio
termos um protagonista de um block-buster que finalmente tem problemas
filosóficos e emocionais realmente pesados, daqueles que só a mais fina sci-fi
pode prover. A fotografia do filme é provavelmente a melhor do ano. E os atores
estão ótimos.
Não é só um filme cheio de ideias interessantes, mas é um filme que foi atrás
de explorar algumas delas até as últimas consequências. O Dennis Villeneuve
é um dos caras que está salvando o sci-fi no cinema.  

4 - AS BOAS MANEIRAS
“Olho grande. Boca grande. Mão grande.”
É um dos filmes que eu vi na Mostra de Cinema de São Paulo, e me deixou
devastado. É um daqueles filmes brasileiros que fazem você acreditar. Não só a
maturidade da linguagem, as atuações espetaculares, especialmente da
portuguesa Isabél Zuaa, mas de como o filme toca em tantos assuntos
importantes sem ser panfletário, sem ter como objetivo principal fazer jogo político.
O principal é o que muita gente esquece, que é contar uma história.
Mas mais do que isso, é um filme que tem a “audácia” de entender direito o seu
próprio conceito fantástico, e ao invés de ficar dando piscadelas para o público,
como se espera da maioria do cinema fantástico daqui, ele vai até as últimas
consequências em termos de se levar a sério. É menos um filme que a gente
está acostumado a ver e mais um filme do Guillermo Del Toro.
Não era pra esse filme funcionar. Romance que é ao mesmo tempo um filme de
horror bem violento, um musical e um comentário social. E não só cada pedaço
do filme funciona, mas cada pedaço sustenta o outro, numa corrente de elementos
que se fortalecem. A parte do horror só funciona por causa da parte emocional que
fazem a parte musical funcionar PRA CARAMBA e por aí vai.
Tem um ou outro elo fraco, especialmente na segunda metade, mas este é um
filme para ser celebrado. Quem me dera tivesse ido pra seleção do Oscar.
3 - BABY DRIVER
“I said Michael Myers!”
O diretor Edgar Wright um dia vai ser um daqueles gigantes do cinema. Não só
ele tem um olho (e um ouvido) calibradísimo, mas ele tem foco na história e nos
personagens. Baby Driver é um filme sobre ritmo e música, mas apesar de ser um
filme totalmente editado em cima da trilha sonora, isso só está lá para sustentar a
saga do protagonista e do romance dele.
Um filme pipoca perfeito, sem elos fracos, que se interessa em explorar o esquisito
ao mesmo tempo que o estiloso. Se o cara que fez a Trilogia do Cornetto e Scott
Pilgrim Contra o Mundo deu ESSE passo na carreira, estamos todos ansiosos
para o próximo passo.

2 - DUNKIRK
“I can almost see it.”
Christopher Nolan já é um gigante. Mesmo nunca largando seu terno e gravata,
consegue fazer um cinema pop elegante, embora as vezes com uma
emocionalidade mal calculada. E alguns problemas de roteiro.
Mas Dunkirk deixa tudo isso para trás. Nolan junta toda a experiência das décadas
em que aprendeu a fazer mágica com o tempo narrativo em seus filmes, além de
estabelecer um amor pelo cinema cru e assombroso, e faz um filme de guerra que
está mais preocupado na poesia e na humanidade do que na batalha e na política.
E os olhos de Kenneth Branagh dizem tudo. A esperança pode ser um dos
caminhos para a vitória, mesmo que seja uma vitória no meio de uma derrota.
Quando um cara consegue fazer cenas de batalha aérea usando aviões de
verdade como essas em IMAX, você sabe que encontrou um cineasta especial.
Quando o estúdio enviou cópias em DVD para os membros da Academia por
questões de votação para o Oscar, Nolan não deixou enviarem seu filme,
enviando no lugar uma nota escrita à mão dizendo que esse filme foi feito para
ver no cinema. Numa tela imensa. Em 70mm. O Nolan é o meu tipo de nerd.

1 - STAR WARS EPISODE VIII - THE LAST JEDI
“And i will not be the last Jedi.”
Ainda batalhando com a declaração seguinte, mas lá vai. O melhor filme da saga
inteira. O “mais cinema”, “mais filme”, mais personagens, mais coração, mais
místico, mais político.
Não só é um filme denso, com camadas e camadas de significado, muito além da
simplicidade de uma história pulp de space opera. É um filme profundo que é
belíssimo, editado com esperteza e atuado com sabedoria. Nem dá para escolher
o melhor momento do filme. A grande revelação de Luke, no final? O pulo para o
hiperespaço? O vôo da Força? Snoke dizendo que o capacete de Kylo Ren é
patético? Chewie vegetariano? O frame final? A visita de um velho amigo? O
conceito, jornada e conclusão final da personagem de Rose Tico? O momento
definitivo de R2-D2? Cada segundo de Carrie Fisher em tela? O sorriso de
Luke no meio da luta final?
A maneira como Luke ensina o que é a Força. Desde o Mestre Yoda em O Império
Contra-Ataca não temos uma sequência tão bela que nos envolve em imaginação,
fantasia, espiritualidade pulp e nos personagens como essa.
Rian Johnson foi corajoso no roteiro, empurrando os personagens (e o público)
para anos-luz longe de suas zonas de conforto. Foi corajoso na técnica, pois
decidiu filmar um Star Wars sem se prender às técnicas usadas nos outros 7
filmes da saga, brincando com lentes diferentes do comum, com câmera lenta,
com silêncio. Dêem mais uns filmes para ele e ele vai querer colocar uma cena
em preto-e-branco, esse blasfemo.
Um triunfo mais do que necessário no final de um ano difícil para todo mundo.
Star Wars voltando a ser relevante, e agora mais do que nunca, se
tornando eterno.